quinta-feira, 3 de abril de 2008

25 de Abril contado pelos protagonistas:-ENTREVISTA A OTELO SARAIVA DE CARVALHO-1994, Lisboa

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3s até 6m46s

E – Otelo vamos continuar na análise destes acontecimentos dos… das vésperas do dia 25 e do próprio dia. Eu possivelmente não vou pedir-lhe que faça um relato pormenorizado, nem sequer factual porque isso demoraria horas e isso está feito, esse relato está feito, quer no seu livro, quer noutros relatos bastante pormenorizados das acções desenvolvidas nesse dia. Talvez, seja preferível fazer no nosso caso um balanço, digamos assim, de conjunto destes acontecimentos. E, obviamente, que o balanço pelo próprio êxito das acções está feito, é um balanço obviamente, altamente positivo, já que mais não seja pelo resultado. De qualquer modo ouvem-se, obviamente, avaliações mais entusiásticas, menos entusiásticas, acerca da maneira como a operação foi organizada como as operações foram organizadas e parece-me que de facto é necessário talvez até pelos desenvolvimentos futuros que tudo isto teve, que se faça justiça, penso que eu que de facto é um pouco isso que se trata aqui, que se faça justiça a quem mais merece que se faça ou seja quem, no meio disto tudo tem mais responsabilidade e obviamente também mais direito enfim, a... aos louros que daí advêm. Além da sua pessoa que, obviamente não está aqui em causa, como autor do plano, e que todos reconhecem como o nome principal dentro da organização, quem é que associa como nomes, ou como elementos de grande responsabilidade nas tarefas do 25 de Abril?

O – Refere-se ao 25 de Abril propriamente dito o...

E – Exacto... exacto. Ao dia e às acções desencadeadas no dia

O – Exactamente. Há outros nomes que poderiam ser indicados foram o Vasco Lourenço, que foi uma figura marcante, imprescindível do MFA, mas que por casualidade não participou directamente no 25 de Abril porque estava ausente – tinha sido transferido para o Açores – o Vasco Lourenço foi uma de facto uma figura extremamente... de grande importância para a mobilização de camaradas do tempo dele. Capitães e tal... para se conjugarem esforços no sentido de se caminhar para um objectivo que acabará por ser o derrube do governo em 25 de Abril. Portanto, infelizmente ele não estava cá se não teria tido uma participação, com certeza, extremamente activa.

E – Mas, já agora... enfim se isso tiver alguma importância, qual seria o papel dele, se cá estivesse? Tinha uma... Qual era o papel que, por natureza, lhe estaria destinado?

O – Eu julgo que o Vasco Lourenço, teria, no mínimo, colaborado comigo, ter estado comigo... teria estado comigo muito activamente, teria estado no posto de comando, com certeza, não é? O Vasco Lourenço era um elemento, apesar de grande desempenho que ele teve na parte da organização e de ligação, sobretudo de ligação, muito, muito estrita com os capitães e na aglutinação do todo o movimento, eu julgo que o Vasco Lourenço era uma homem muito calhado para... para a questão operacional, não era? E teria estado comigo no Posto de Comando, era um dos três elementos da Direcção... Enquanto o Vítor Alves ficou no Estado Maior do Exército, o Vasco Lourenço teria estado, com certeza, comigo no Posto de Comando, era a única possibilidade que eu via de ele ter, de facto participado activamente, de termos tomado decisões conjuntas. Assim...

E – Assim ficou sozinho a ter que tomar essas decisões...

O – Fiquei eu com... elementos que escolhi, outros que se nos juntaram, o Vítor Alves, por exemplo, enviou o Sanches Osório, foi uma peça importante também no Posto de Comando da Pontinha e juntaram-se-me outros elementos, outros que eu nem sequer tinha escolhido mas que acabaram por se reunir comigo no Posto de Comando e que também desempenharam o seu papel activo, claro...

E – Como por exemplo?

O – Olhe estou-me a lembrar do major Hugo dos Santos, que acabou por ir ter comigo ao Posto de Comando levando também um outro camarada que é hoje general, que é o presidente dos Serviços Sociais das Forças Armadas que é o Adérito Figueira, que também acabou por estar lá no Posto de Comando, caído do céu, porque não... não estava previsto, mas comigo no Posto de Comando, escolhido por mim, esteve o tenente-coronel Lopes Pires que eu tinha recrutado na Academia militar onde ele era professor, o Garcia dos Santos, também escolhido por mim e que era o meu oficial de transmissões e que esteve ali em permanente apoio a todo o sistema de transmissões por ele montado, com o apoio da Escola Prática de Transmissões. Esteve o Vítor Crespo que teve um papel fundamental em tudo o que dizia respeito à Marinha. O comandante Almada Contreiras desempenhava também uma função primordial no aspecto de ligações com a Marinha porque ele próprio, Almada Contreiras, era o chefe de comunicações da Armada..... Esteve

E –... Também esteve na Pontinha?...

O – Não, esteve, exactamente, no centro de ligações da Armada, onde dominou as ligações da Armada. Portanto, tudo aquilo que nós quisemos receber de comunicações da Armada, o Almada Contreiras fez sempre essa escuta e informou permanentemente o Posto de Comando, concretamente o Vítor Crespo que era o elemento de ligação dele no Posto de Comando, que fornecia depois essas informações a mim próprio ou aos elementos que se encontravam no Posto de Comando, não é? Pois foram elementos, de facto, preciosos.

E – Sobretudo Garcia dos Santos, penso eu, que é também outra...?

O – Garcia dos Santos foi uma pedra fundamental. Portanto, nenhuma militar pode decorrer com grande eficácia se não tiver suportada num aparelho de transmissões, num aparelho de transmissões, ou num sistema, melhor, que esteja montado com grande eficiência e com grande competência como foi o caso do sistema de transmissões montado pelo Garcia dos Santos, que conjugava a possibilidade de ligação rádio com as unidade intervenientes, como também com a comunicação telefónica e com o sistema de escutas que ele também tinha montado em relação aos telefones militares. Como sabe há uma rede militar e há uma rede civil, não é? E o Garcia dos Santos tinha tido essa possibilidade de fazer a montagem, a partir da Escola Prática de Transmissões de um sistema de escutas em relação aos telefones das altas entidades militares e que nos deu a possibilidade de estarmos permanentemente actualizados com a informação decorrida de quais eram as intenções da parte contrária, das forças governamentais, pelo menos na parte da instituição militar.
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27m10s até 28m56s



E – Pois... Quando eu digo também concorda até pela a própria definição política deste cenário uma vez que o regime português na altura não era nada simpático aos próprios países da NATO e só lhe criava dificuldades

O –... E aos Estados Unidos.

E –... E aos próprios Estados Unidos. Portanto quando eu digo que há uma atenção muito especial, mesmo à distância da NATO, poderá ser apenas no sentido até, de ver, se... para que lado, enfim de se informar, de ver para que lado cai, e até uma tentativa, digamos... de assentimento, não é? Uma vez que não intervem? Uma tentativa de assentimento de apoio à... à...

O –...E até sintomático o facto da esquadra da NATO já estar a sair o Tejo quando a fragata lá recebe indicação por mando do Ministro da Marinha, do Crespo, Almirante Pereira Crespo, recebe indicação para regressar rapidamente, sair, abandonar a esquadra e regressar ao estuário do Tejo e fundear junto ao Terreiro do Paço e a esquadra da NATO não regressa toda ela para a frente do Terreiro do Paço, continuam o seu caminho, sim senhor, e autorizam que fragata portuguesa Pereira da Silva regresse e fundeie em frente ao Terreiro do Paço.

E – Sim, sim.... Bom

O – Quer dizer a esquadra da NATO não se imiscui...

E –... Neste momento, não.

O-...neste problema interno

E – mas vamos ver no decurso, no avançar do processo e em datas críticas como o 11 de Março, o 28 de Setembro etc. como é que há sempre operações da NATO e há sempre proximidade e, portanto, navios da NATO próximo da costa portuguesa em missão no, no mínimo de observação. No mínimo dizemos nós...

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