quinta-feira, 15 de maio de 2008

8º ANO: BIOGRAFIA-DAMIÃO DE GÓIS: HISTÓRIA DE PORTUGAL

A vida de Damião de Góis
Damião de Góis
Damião de Góis distingue-se na História portuguesa pelos seus feitos de humanista e de historiógrafo. Numa época em que as novas ideias fervilhavam por toda a Europa mas eram censuradas pela Inquisição, Damião de Góis fez, até ao fim, valer a sua posição.Damião de Góis nasceu em Fevereiro de 1502 numa quinta em Alenquer, perto de Lisboa. O seu pai era Rui Dias de Góis, almoxarife da rainha D. Leonor, e a sua mãe era Isabel Gomes de Limi, neta de Nicolau de Limi, um nobre flamengo que se havia estabelecido em Portugal.Em 1511, com apenas 9 anos de idade, entra para o Paço da Ribeira, como pajem do rei D. Manuel I. Pouco tempo depois, fica com as funções de moço de câmara.Em 1513, fica órfão de pai. Nessa altura, e como era hábito na época, os moços de câmara e fidalgos tinham direito a uma educação esmerada e polivalente na corte portuguesa. Foi o que aconteceu ao jovem Damião.Nos Paços Reais, Damião não só recebeu uma educação digna das maiores hierarquias da nobreza como fez amizade com o futuro rei D. João III, que tinha a sua idade. As brincadeiras que partilharam na infância já faziam antever a amizade que se iria seguir na idade adulta.Com um acesso tão privilegiado à corte, Damião testemunha alguns acontecimentos marcantes da História de Portugal: o período áureo do reinado de D. Manuel e o início dos Descobrimentos e da Expansão portuguesa. Além disso, convive com fidalgos de renome, homens de armas e marinheiros e assiste ao nascimento do futuro Cardeal D. Henrique, que viria a ser Inquisidor-Geral e rei. Conhece todos os poetas que frequentam a corte e nomes históricos como Pedro Nunes, Garcia de Orta e Gil Vicente.D. Manuel I morre em 1511 e, dois anos depois, Damião de Góis parte para a Flandres, a mando de D. João III. Embarca na armada de Pêro Afonso de Aguiar para ir desempenhar as funções de escrivão na Feitoria portuguesa de Antuérpia. É o início de uma vida inteira de viagens pela Europa...Estabelecido num dos maiores centros cosmopolitas da Europa, onde a riqueza material e cultural é fácil de alcançar, Damião de Góis depressa começa a tirar o melhor partido desta situação.Ao mesmo tempo que desempenha as suas funções na Feitoria, Damião de Góis completa os seus estudos humanísticos e viaja por todas as províncias dos Países Baixos. Numa destas viagens, visita Freiburg, onde conhece Erasmo.Em 1529, desloca-se à Europa Oriental, como enviado régio de D. João III, com a missão de tratar do casamento do Infante D. Luís com Edviges, filha de Sigesmundo I. Visita Dantzig, Vilna, Thorn, Cracóvia e Poznan.Em 1531, regressa ao oriente europeu, novamente como enviado régio de D. João III. Visita Schleswig, Lübeck, Luneburg, Ülzen, Magdeburg, Wittemberg, Frankfurt, Poznan e Dantzig. Nestas viagens, trava conhecimento com importantes vultos do humanismo europeu: além de Erasmo, conhece Lutero, Melanchton, Dürer, Johannes Magnus, Bonifácio Amerbach, Nicolau Clenardo, entre outros.Entre tantos humanistas, quem mais o influenciou foi Erasmo de Roterdão, na casa de quem chegou a estar hospedado. Damião de Góis sentia um grande fascínio pela personalidade de Erasmo e estava muito interessado no movimento da Reforma Protestante.Em 1533, Damião de Góis regressa a Portugal, onde D. João III lhe oferece o cargo de tesoureiro da Casa da Índia, um dos melhores cargos públicos da época. Damião recusa porque quer voltar para o estrangeiro.É nessa altura que Damião de Góis passa alguns meses hospedado na casa de Erasmo, em Freiburg, onde conhece Glareanus, um historiador, poeta, filósofo, matemático e músico. Pensa-se que terá sido nesta época que Damião decidiu desenvolver as suas aptidões musicais.Depois da estada em casa de Erasmo, Damião parte para Pádua, na Itália, para prosseguir os seus estudos universitários. Em Pádua, conhece o geógrafo Ramúsio, o basco Inácio de Loyola e o padre Simão Rodrigues de Azevedo. Em 1538, termina os seus estudos e regressa aos Países Baixos.Em Haia, casa com Joanna van Hargen, filha de um conselheiro flamengo do Imperador Carlos V. Dedica-se à escrita de várias obras em latim (a língua, por excelência, do período humanista) com o objectivo de dar a conhecer as glórias portuguesas no Oriente.Em 1545, regressa definitivamente a Portugal. A pedido de D. João III, vinha ocupar o cargo de mestre e guarda roupa do príncipe D. João. Devido à oposição de alguns sectores da sociedade portuguesa da época, nomeadamente dos jesuítas, Damião de Góis nunca chegou a desempenhar esse cargo.Nessa altura, a Inquisição já andava a prestar mais atenção ao humanista português. O padre Simão Rodrigues, com quem Damião privara em Pádua, formulara uma denúncia ao Tribunal do Santo Ofício contra Damião de Góis, com base na relação próxima que o português tivera com Lutero. Para o padre português, Damião de Góis era, tal como os humanistas com quem estabelecera contacto, um herege.Talvez devido aos conhecimentos que tinha na corte e à amizade de infância que o ligava ao rei e ao Cardeal Inquisidor D. Henrique, a denúncia não chegou a ir para a frente.Em 1548, foi nomeado, por alvará régio, Guarda-mor da Torre do Tombo. Nos Paços de Alcáçova, onde vivia, Damião de Góis levava uma vida de fausto e opulência, propícia a convívios de música e canto, o que provocava sentimentos de inveja junto da sociedade portuguesa.Em 1550, é novamente denunciado à Inquisição, mais uma vez pelo padre jesuíta Simão Rodrigues. A denúncia voltou a não ter seguimento.Enquanto guarda-mor, Damião de Góis pôde aperfeiçoar o seu ofício de historiógrafo, devido ao contacto próximo que tinha com os documentos históricos. Assim, em 1558, um ano depois da morte de D. João III, o Cardeal D. Henrique, então regente do reino, incumbe-lhe a tarefa de escrever a Crónica d´El Rei D. Manuel.Durante alguns anos, Damião de Góis trabalha com afinco e dedicação na redacção do texto. O seu lado humanista, fiel aos factos históricos e avesso a bajulações hipócritas, fez com que escrevesse a Crónica com a maior isenção que lhe era possível.Assim, em 1566, saem as 1.ª e 2.ª partes da Crónica de D. Manuel. No ano seguinte, é a vez de verem a luz do dia as 3.ª e 4.ª partes e a Crónica do Príncipe D. João.A verdade nua e crua das crónicas não agradou aos grandes senhores do reino. Choveram protestos e acusações contra o humanista e o seu processo foi reaberto pela Inquisição.A 31 de Março de 1571, o Conselho Geral do Santo Ofício ordenou a prisão de Damião de Góis, que entrou para os seus cárceres secretos em 4 de Abril do mesmo ano. No dia 2 de Maio de 1572, o humanista foi formalmente acusado de “herege, luterano, pertinaz e negativo”. Foi preso no
Mosteiro da Batalha pouco depois de ter sido proferida a sua sentença.Depois de passar algum tempo na prisão, foi libertado, não se sabendo por que razão. Pouco tempo depois, morreu em circunstâncias misteriosas. Segundo a versão oficial dos acontecimentos, no dia 30 de Janeiro de 1574, Damião de Góis viajava em direcção ao Mosteiro de Alcobaça. Pernoitou numa venda, onde terá caído sobre o fogo de uma lareira que acendera para se proteger do frio. Terá morrido parcialmente calcinado.No entanto, as suspeitas de que tenha sido assassinado são muito fortes. Aquando da transladação dos seus restos mortais da Igreja de Santa Maria da Várzea para a Igreja de S. Pedro, ambas em Alenquer, 350 anos depois da sua morte, confirmou-se a existência de uma fractura no crânio, o que leva a crer que tenha, realmente, sido assassinado.


Damião de Góis e a Inquisição
O papel da Inquisição na vida de Damião de Góis

Numa época em que as ideias humanistas fervilhavam e que o movimento da Reforma Protestante estava no seu auge, a relação do Tribunal do Santo Ofício com os partidários do Humanismo e as suas novas ideias não era das melhores. Embora poupado durante algum tempo, pensa-se que por interferência régia, Damião de Góis acabou por cair nas mãos da Inquisição.Devido às várias viagens que fez pela Europa fora, Damião de Góis tornou-se um fervoroso adepto das ideias humanistas e manteve contactos próximos com grandes nomes do Humanismo e da Reforma Protestante, como Erasmo de Roterdão e Martinho Lutero. Foi, principalmente, o contacto com este último que levou às denúncias feitas pelo padre jesuíta Simão Rodrigues de Azevedo ao Tribunal do Santo Ofício.Aquando da sua estada em Pádua, para prosseguir os seus estudos universitários, Damião de Góis privou com Simão Rodrigues de Azevedo. O padre jesuíta conhecia as relações de amizade de Damião e criticava duramente os contactos que ele mantinha, principalmente, com Lutero.Para Simão Rodrigues, Lutero era a incarnação do Diabo. Pioneiro no movimento da Reforma Protestante, Martinho Lutero era considerado um herege pela Igreja Católica. Damião de Góis, ao manter contactos com tal inimigo do Catolicismo, só poderia ser também, ele próprio, um herege!Além disso, Damião mantinha também relações de amizade com Erasmo de Roterdão que, embora não renegasse o Catolicismo, era também um motivo de desconfiança para a Igreja Católica.Quando regressou a Portugal, Simão Rodrigues não hesitou em denunciar Damião de Góis à Inquisição. Em Setembro de 1545, Simão Rodrigues dirige-se à Inquisição de Évora para denunciar o seu antigo colega. Acusa-o de heresia e dá como exemplos o facto de Damião de Góis, aquando da sua estada em Pádua, ter louvado Lutero, defendido as suas ideias heréticas e ter demonstrado grande consideração pelo protestante.Apesar de Simão Rodrigues ocupar uma alta posição na sociedade da época, os inquisidores não deram seguimento ao processo de Damião de Góis. Pensa-se que o facto de Damião ser amigo íntimo de D. João III e do Cardeal D. Henrique tenha sido a principal razão para que o Santo Ofício ignorasse as denúncias. Além disso, apesar de Simão Rodrigues ser uma testemunha de confiança, não existiam mais testemunhas para os factos delatados.A acrescentar a estas razões, está também o estatuto de Damião de Góis enquanto figura de prestígio por toda a Europa. Levar adiante uma queixa desta natureza provocaria, provavelmente, reacções muito adversas vindas de toda a Europa, o que não conviria nada ao reino.Porém, Simão Rodrigues não desiste. Em 1550, volta a denunciar Damião de Góis, desta vez em Lisboa. Reafirma as suas acusações e acrescenta que viu Damião de Góis a comer queijo fresco e carne em dias proibidos pela Igreja Católica.Mais uma vez, as denúncias não tiveram seguimento.Vinte e seis anos passariam até que Damião de Góis fosse, finalmente, preso. Na origem da sua prisão está a Crónica de D. Manuel, publicada em 1566 e 1567, onde o historiógrafo, como humanista que é, faz questão de relatar apenas factos e de não se deixar levar por bajulações hipócritas.Damião de Góis perde, assim, o estado de graça em que vivera toda a sua vida. A Casa de Bragança não lhe perdoa as críticas que faz, os clérigos não gostam que defenda os cristãos etíopes e o Cardeal D. Henrique não aprecia as referências que lhe são feitas.A aparente imunidade de que gozava face ao Santo Ofício chegava, assim, ao fim. As anteriores denúncias de Simão Rodrigues e as novas acusações de Luís de Castro, genro de Damião de Góis, são as responsáveis pela prisão do humanista português.Damião de Góis defende-se das acusações de heresia que lhe são feitas, afirmando que nunca pôs em causa a fé católica, apresenta testemunhas abonatórias, recorda os serviços que prestou ao reino, mas nada parece demover os inquisidores, com o Cardeal D. Henrique à frente das hostilidades.O humanista e historiógrafo é condenado a cárcere penitencial perpétuo, escapando, assim, à sentença de morte na fogueira em auto-de-fé. No entanto, o destino (ou alguém) acaba por levá-lo à morte.A 30 de Janeiro de 1574, Damião de Góis morre, aparentemente de forma acidental, à beira da lareira que acendera para se proteger do frio. Até hoje desconhecem-se as verdadeiras causas da sua morte e permanecem as suspeitas de que tenha sido assassinado.


Damião de Góis, o humanista
Damião de Góis, humanista português

O séc. XVI foi, por excelência, o século das novas ideias a todos os níveis. O Renascimento recuperou as formas e estilos clássicos e instituiu o latim como língua de eleição. Um debate filosófico, teológico, científico e literário, capaz de questionar tudo e todos, emergia nos círculos intelectuais e culturais de toda a Europa.Em Portugal, desde logo surgiu uma grande apetência por tudo o que se passava no resto da Europa. Alguns portugueses, fascinados com as novas correntes de pensamento do Humanismo, partiram para novas paragens em busca de novos e mais abrangentes conhecimentos.Foi o caso de Damião de Góis que, em 1523, partiu para a Flandres por ordem régia. Durante mais de vinte anos correu mundo e relacionou-se com os mais eminentes nomes do Humanismo europeu. Nas suas viagens, conheceu Erasmo de Roterdão, Martinho Lutero, Melanchton, entre outros nomes célebres.Damião de Góis chegou mesmo a hospedar-se em casa de Erasmo, onde tomou contacto com as suas filosofias e ideias simpatizantes luteranas. Seriam principalmente estes conhecimentos que viriam a estar na origem das denúncias à Inquisição do padre jesuíta Simão Rodrigues, seu colega em Pádua, onde estudou na universidade.Apesar de, em muitos aspectos, Portugal estar muito virado “para fora” (não podemos esquecer que se viviam os anos áureos da Expansão Portuguesa), o Catolicismo estava muito implantado no reino, com todas as consequências que esse facto teria na possível abertura das mentes de todos os que ansiavam por mais saber.A Inquisição instalara-se em Portugal em 1536 e, com ela, a intolerância a nível religioso e cultural. Apesar de muitas das ideias humanistas não atacarem a religião, o simples facto de serem inovadoras já preocupava o Tribunal do Santo Ofício, que pretendia a todo o custo manter a ordem tradicional.Ainda assim, Damião de Góis conseguiu escapar, durante alguns anos, às garras acusatórias da Inquisição. Por ser muito bem relacionado dentro do reino e por ter alcançado um certo estatuto no estrangeiro, o Tribunal do Santo Ofício demorou algum tempo até o acusar de heresia.Na época, as ideias humanistas confundiam-se com heresia e desrespeito pela Igreja Católica porque estavam muito associadas a nomes como o de Martinho Lutero e o seu movimento de Reforma Protestante. À abertura de espírito e mentalidade europeias opunha-se a intolerância da Inquisição. Damião de Góis foi, apenas, mais uma das vítimas da intolerância inquisitorial...

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